O que é cidadania?
No
Brasil ainda há muito que fazer em relação à questão da cidadania. Por
exemplo acabar com a violência.
No decorrer da história da humanidade
surgiram diversos entendimentos de cidadania em diferentes momentos – Grécia e
Roma da Idade Antiga e Europa da Idade Média. Contudo, o conceito de cidadania
como conhecemos hoje, insere-se no contexto do surgimento da Modernidade e da
estruturação do Estado-Nação.
O termo cidadania tem origem etimológica no latim civitas, que significa
"cidade". Estabelece um estatuto de pertencimento de um indivíduo a
uma comunidade politicamente articulada – um país – e que lhe atribui um
conjunto de direitos e obrigações, sob vigência de uma constituição. Ao
contrário dos direitos humanos – que tendem à universalidade dos direitos do ser humano na sua dignidade –, a cidadania
moderna, embora influenciada por aquelas concepções mais antigas, possui um
caráter próprio e possui duas categorias: formal e substantiva.
A cidadania formal é, conforme o direito
internacional, indicativo de nacionalidade, de pertencimento a um Estado-Nação,
por exemplo, uma pessoa portadora da cidadania brasileira. Em segundo lugar, na
ciência política e sociologia o termo adquire sentido mais amplo, a cidadania substantiva
é definida como a posse de direitos civis, políticos e sociais. Essa última
forma de cidadania é a que nos interessa.
A compreensão e ampliação da cidadania
substantiva ocorrem a partir do estudo clássico de T.H. Marshall – Cidadania e classe social, de
1950 – que descreve a extensão dos direitos civis, políticos e sociais para
toda a população de uma nação. Esses direitos tomaram corpo com o fim da 2ª
Guerra Mundial, após 1945, com aumento substancial dos direitos sociais – com a
criação do Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) – estabelecendo
princípios mais coletivistas e igualitários. Os movimentos sociais e a efetiva
participação da população em geral foram fundamentais para que houvesse uma
ampliação significativa dos direitos políticos, sociais e civis alçando um
nível geral suficiente de bem-estar econômico, lazer, educação e político.
A cidadania esteve e está em permanente
construção; é um referencial de conquista da humanidade, através daqueles que
sempre buscam mais direitos, maior liberdade, melhores garantias individuais e
coletivas, e não se conformando frente às dominações, seja do próprio Estado ou
de outras instituições.
No Brasil ainda há muito que fazer em
relação à questão da cidadania, apesar das extraordinárias conquistas dos
direitos após o fim do regime militar (1964-1985). Mesmo assim, a cidadania
está muito distante de muitos brasileiros, pois a conquista dos direitos
políticos, sociais e civis não consegue ocultar o drama de milhões de pessoas
em situação de miséria, altos índices de desemprego, da taxa significativa de
analfabetos e semianalfabetos, sem falar do drama nacional das vítimas da
violência particular e oficial.
Conforme sustenta o historiador José
Murilo de Carvalho, no Brasil a trajetória dos direitos seguiu lógica inversa
daquela descrita por T.H. Marshall. Primeiro “vieram os direitos sociais,
implantados em período de supressão dos direitos políticos e de redução dos
direitos civis por um ditador que se tornou popular (Getúlio Vargas). Depois
vieram os direitos políticos... a expansão do direito do voto deu-se em outro
período ditatorial, em que os órgãos de repressão política foram transformados
em peça decorativa do regime [militar]... A pirâmide dos direitos [no Brasil]
foi colocada de cabeça para baixo”.1
Nos países ocidentais, a cidadania
moderna se constituiu por etapas. T. H. Marshall afirma que a cidadania só é
plena se dotada de todos os três tipos de direito:
1. Civil: direitos inerentes à liberdade
individual, liberdade de expressão e de pensamento; direito de propriedade e de
conclusão de contratos; direito à justiça; que foi instituída no século 18;
2. Política: direito de participação no
exercício do poder político, como eleito ou eleitor, no conjunto das
instituições de autoridade pública, constituída no século 19;
3. Social: conjunto de direitos
relativos ao bem-estar econômico e social, desde a segurança até ao direito de
partilhar do nível de vida, segundo os padrões prevalecentes na sociedade, que
são conquistas do século 20.